quinta-feira, 14 de maio de 2009

138 - " OS ETERNOS MOMENTOS DE POETAS E PENSADORES DA LINGUA PORTUGUESA "

 "Meu Jardim" Foto LuisD.



SOPHIA DE MELLO BREYENER ANDRESEN
Sophie de Mello Breyener Andresen de Sousa Tavares
Nasceu a 06 de novembro, de 1919, signo de escorpião
Cidade do Porto, Portugal. Neta de dinamarquês, por parte
de pai. Estudou Filologia Românica, na Faculdade de Letras,
da Universidade de Lisboa. Membro da "Academia das Ciências
de Lisboa". Possivelmente, seja a poeta
de maior expressão no final do século XX.
Homenagens: "Grande Premio de Poesia"; Sociedade
Portuguesa de Escritores(Livro Sexto, 1962); Premio
"D.Dinis", Fundação Casa de Mateus, 1989; Premio "Rainha Sofia"
de Poesia Ibero-Americana, 2003; Premio "Camões"1999.
Premio "Teixeira de Pascoaes", 1977;
Medalha de Honra, do Presidente do Chile, 2004 . . .
Foi instituído em 2005 o Premio "Sophie de Mello Breyener
Andresen", pela Câmara Municipal de S. João da Madeira e
A.P.E.(Associação Portuguesa de Escritores).
Faleceu, 02 de julho de 2004.
* CANTOePALAVRAS
Poesia, 1944; Dia do Mar, 1947; Coral, 1950;
No Tempo Dividido, 1954; Mar Novo, 1958;
O Cristo Cigano, 1961; Livro Sexto, 1962;
O Cavaleiro da Dinamarca, 1964(conto infantil)
Geografia, 1967; Grades, 1970; Dual, 1972; 

O Nome das Coisas, 1977;
Navegações, 1982; Ilhas, 1989 . . .
*
I
Quando à noite desfolho e trinco as rosas
É como se prendesse entre os meus dentes
Todo o luar das noites transparentes,
Todo o fulgor das tardes luminosas,
O vento bailador das Primaveras,
A doçura amarga dos poentes,
E a exaltação de todas as esperas.
*
SOPHIA DE MELLO BREYENER ANDRESEN
"As Rosas"
Dia do Mar
*
II
Sozinha estou entre paredes brancas
Pela janela azul entrou a noite
Com seu rosto altíssimo de estrelas.
*
SOPHIE DE MELLO BREYENER ANDRESEN
"A Noite"
Mar Novo
*
III
Tu dormes embalado nos rochedos
E aos meus ouvidos vem falar o vento.
Escuto, busco, chamo e não respondes,
E todo o mundo se tornou fantasma.
-
Estou fechada, suspensa, prisioneira
Queria voltar para fora, para o dia
Ressurgir, respirar, tornar a ver,
Mas todo o mundo se tornou fantasma.
-
E a voz do mar encheu o céu e a terra
Uma vez que está cheia e que se quebra
E nunca mais acaba.
-
Pássaros brancos cortam as janelas,
Anêmonas cintilam nos rochedos:
Terror de estar sózinha e de escutar
Com este tempo morto entre meus dedos.
*
SOPHIE DE MELLO BREYENER ANDRESEN
"Soneto"
Coral
*
"Meu Jardim" Foto LuisD.
IV
Quando eu morrer voltarei para buscar
Os instantes que não vivi junto do mar.
*
SOPHIE DE MELLO BREYENER ANDRESEN
"Inscrição"
Livro sexto
*
V
Um por um para o mar passam os barcos
Passam em frente de promontórios e terraços
Cortando as águas lisas como um chão
-
E todos os deuses são de novo nomeados
Para além das ruínas dos seus templos
*
SOPHIE DE MELLO B. ANDRESEN
"Barcos"
Livro Sexto
*
VI
Poesia de inverno:
poesia do tempo sem deuses
Escolha
cuidadosa entre restos
-
Poesia das palavras envergonhadas
Poesia dos problemas de consciência das palavras
-
Poesia das palavras arrependidas
Quem ousaria dizer:
-
Seda nácar rosa
-
Árvore abstrata e desfolhada
No inverno da nossa descrença
*
Pinças asséticas
Colocam a palavra coisa
Na linha do papel
Na prateleira das bibliotecas
*
Quem ousaria dizer:
-
Seda nácar rosa
-
Porque ninguém teceu com suas mãos a seda - em
longos dias em compridos fusos e com finos sedosos
dedos.
E ninguém colheu na margem da manhã a rosa - leve
e pesada faca de doçura.
-
Pois o rio já não é sagrado e por isso nem sequer é rio
-
E o universo não brota das mãos dum deus do gesto
e do sopro dum deus da alegria e da veemência dum deus.
-
E o homem pensando à margem do destino procura
arranjar licença de residência na caverna provisória dos
sobreviventes.
*
Meu coração busca as palavras do estio
Busca o estio prometido das palavras.
*
SOPHIA DE MELLO B. ANDRESEN
"Poesia de Inverno"
Geografia
*
VII
Passavam pelo ar aves repentinas,
O cheiro da terra era fundo e amargo,
E ao longe as cavalgadas do mar largo
Sacudiam na areia as suas crinas.
-
Era o céu azul, o campo verde, a terra escura,
Era a carne das árvores elástica e dura,
Eram as gotas de sangue da resina
E as folhas em que a luz se descombina.
-
Eram os caminhos num ir lento,
Eram as mãos profundas do vento
Era o livre e luminoso chamamento
Da asa dos espaços fugitiva.
-
Eram os pinheiros onde o céu poisa,
Era o peso e era a cor de cada coisa,
A sua quietude, secretamente viva,
E a sua exalação afirmativa.
-
Era a verdade e a força do mar largo,
Cuja voz, quando se quebra, sobe,
Era o regresso sem fim e a claridade
Das praias onde a direito o vento corre.
*
SOPHIE DE MELLO B. ANDRESEN
"Paisagem"
Poesia
*
VIII
Esperança e desepero de alimento
Me servem neste dia em que te espero
E já não sei se quero ou se não quero
Tão longe de razões é meu tormento.
-
Mas como usar amor de entendimento?
Daquilo que te peço desepero
Ainda que mo dês ▬ pois o que eu quero
Ninguém o dá senão por um momento.
-
Mas como és belo, amor, de não durares,
De ser tão breve e fundo o teu engano,
E de eu te possuir sem tu te dares.
-
Amor perfeito dado a um ser humano:
Também morre o florir de mil pomares
E se quebram as ondas no oceano.
-
SOPHIE DE MELLO B. ANDRESEN
"Soneto à Maneira de Camões"
Coral 

*
IX
Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.
-
Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.
-
Porque os outros se compram e se vendem
E os gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.
-
Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.
*
SOPHIE DE MELLO B. ANDRESEN
"Porque"
Antologia
*
X
Escuto mas não sei
Se o que oiço é silêncio
ou deus
-
Escuto sem saber se estou ouvindo
O ressoar das planícies do vazio
Ou a consciência atenta
Que nos confins do universo
Me decifra e fita.
-
apenas sei que caminho como quem
É olhado amado e conhecido
E por isso em cada gesto ponho
Solenidade e risco.
*
SOPHIE DE MELLO B. ANDRESEN
"Escuto"
Geografia
OLGA SAVARY
Nasceu a 21 de maio de 1933, signo de gemeos,
Belém do Pára, Estado do Pará, Brasil.
Jornalista. poeta, escritora . . .
Na Música de Vanguarda Brasileira, alguns dos seus
poemas, forma musicados, compositores como
Aylton Escobar, Guerra Peixe, Guilherme Bauer . . .
e vários compositores da Música Popular Brasileira.
Participou do jornal "O Pasquim" de 1969 a 1982.
Júri do "Festival de Musica Popular Brasileira", 1980.
Homenagens: Premio "Jabuti", 1971;Premio de Poesia
A.P.C.A., Associação Paulista de Críticos de Arte,1977
e 2008; Premio "Odorico Mendes, 1980;
Premio de Poesia "Lupe Cotim Garaude", União
Brasileira de Escritores de São Paulo, 1981;
Premio "Olavo Bilac", Academia Brasileira de Letras, 1983;
Premio "Assis Chateaubriand", Academia Brasileira de
letras, 1987; Premio Nacional de Poesia "Artur Sales,
Academia de Letras da Bahia, Salvador, 1987.
*
CANTOePALAVRAS
Espelho Provisório, 1970; Sumidoro, 1977; Altaonda, 1979;
Natureza Viva, 1982; Magna, 1982; Hai-Kais, 1986; Linha
d'água, 1987; Retratos, 1989; Rudá, 1994; Éden Hades, 1984;
As Margens e o Centro, 1994; Berço Esplêndido, 1987; Morte
de Moema, 1996; Anima Animalis, 1996; O Olhar Dourado do
Abismo(contos), 1997; Contos da Paixão(contos), 2001. . .
*
I
Consumo o que me oferecem: tudo.
Quero balas o mau café
a laranjada sintética,
o asséptico sanduiche,
- distrações do medo para alguns.
Não morrerei (de fome) no avião.
*
OLGA SAVARY
" Vôo "
Eden Hades
*
II
A grama brota do asfalto
Os relógios inauguram o mundo dos insetos
e os jasmineiros enovelam os bairros
-
O som da ternura quebra a lâmpada azul.
*
Súbito
a mulher entra voando pela janela da condução
Os cabelos da mulher enchem o bojo da tarde operária:
o ar é um canteiro de flores.
-
Das varandas,
homens espargem água fresca sobra as plantas e sobre a mulher
Depois suavemente penetram o corpo-arvoredo
à procura do sono.
*
OLGA SAVARY
"Rua Verde"
Eden Hades
*
III
Que eu toda me torne desterro,
lugar de exílio, exílio em ti.
Meu corpo é um edifício erguido
com vista para o mar, ou seja,
como o mar rodeando uma ilha,
toda com vista para ti, anjo.
-
Que sejas a tensa corda
do arco só a atirar
- único prazer da memória -
setas não para a altura
mas em única direção:
abaixo da minha cintura.
E te amo morto ou vivo, anjo,
com certeza de quem sabe
do grande fogo des víceras,
cartas marcadas de risco,
cujo mapa é só abismo,
precipício onde cai.
-
de mãos dadas com o perigo
e as sete quedas do vício.
*
OLGA SAVARY
"Liberdade Condicional"
Linha d'Água
*
IV
Tudo se veste da cor de teu vestido azul
Tudo - menos a dona do vestido:
meus olhos se passeiam nua
pela grama do campo de golfe.
-
Uma curva e eis-nos diante de meu coração.
-
Não amiga não temas
meu coração;
é apenas um chapéu surrado
que humildemente estendo
para colher um pouco de tua alegria
de tua graça distraída
de teu dia.
*
OLGA SAVARY
"Manhã de Sol com Azulejos"
Eden Hades
RENATA PALLOTTINI
Nasceu, 20 de janeiro de 1931, signo de capricórnio,
São Paulo, Brasil.
Poetisa, doutorou-se em Direito pela Faculdade de Direito, do
Largo de São Francisco, U.S.P., São Paulo ; Filosofia,
Largo de São Bento, da Pontíficia Universidade Católica,
São Paulo; Dramaturgia, Escola de Arte Dramática da U.S.P.,
São Paulo; História da Arte, Universidade de Madrid, Espanha. . .
Homenagens: Premio "Pen Clube" do Brasil,1961;
Premio "Governador do Estado", São Paulo (teatro) 1965;
Premio "Molière" (teatro), 1965; Premio "Anchieta" (teatro), 1969;
Premio "Jabuti", 1996; Premio "Cecília Meireles", 1997 . . .
*
CANTOePALAVRAS
Obra Poética, 1995; Oficios e Amargura(romance), 1998;
Um Calafrio Diário, 2002; Colônia Cecília(teatro), 2002 . . .
*
I
Ele chega amplamente de manhã.
Vem falando, e ao chegar boceja e diz verdades
acerca de Pedrão, do céu e da ambrosia
de que não gosta: prefere pão de queijo.
Vai comigo ao trabalho mas não entra na Escola
prefere ficar voando sobre a Raia
porque diz que esses jovens estão sempre em perigo.
Quando voltamos ele vem flutuando
ou se agarra no teto do carro, de carona,
e chega com as penas despenteadas.
-
Come junto comigo e o meu amor é o seu.
Diz que ama São Paulo a despeito de tudo
cuida de mim e (ele também) lê Fernando Pessoa.
*
RENATA PALLOTTINI
"Meu Anjo"
*
II
Não sei o quanto fiz
talvez fizesse hoje d'outrora arte
caminho que andei
não andei, me levaram.
-
era verde e aceitava.
Foi o bom, foi o mau.
Quando doeu, doeu.
Miau.
-
Hoje se limpa o estrume
se contempla o velame
se reaviva o lume
lembra-se o que se amou
e que talvez ainda se ame.
-
e se espera o restante.
Mais falta que sobeja.
-
Assim seja.
*
RENATA PALLOTTINI
"Poeta que Lembra"
Um calafrio Diário
*
III
Falo contigo
e é como falasse
com essa qualidade
de luz das árvores.
-
É perfurar o verde
e emergir do outro lado
(o úmido porvir
dos vegetais).
-
Falo contigo
e compreendo o estado
dos sons que surgem
à noite, noite-em-claro.
-
Falo contigo
e entendo
o que não tem sentido.
-
Amor é assim, palavra:
lime comovido.
*
RENATA PALLOTTINI
"Falar Contigo"
Um Calafrio Diário

MARIAZINHA CONGÍLIO
Maria Aparecida Vidigal
Nasceu em Planalto, Jundiaí, Estado de São Paulo,
Brasil.
Poetisa, Presidente do Clube "Machado de Assis", Portugal . . .
*
CANTOePALAVRAS
Cores do Pensamento, 1973; Raízes ao Vento, 1982;
Geografia do Amor, 1983; Tecendo Esperas, 1986;
Denominador Comum(teatro); Dominó(teatro);
Sinfonia do Tempo, 1994; Branco e Preto, 1968;
Versos . . .
*
I
O Sol entreabre a cortina
no palco do espaço
surge o dia
tímido em luz
tem alegria em seu ventre
a estrela abre os braços
de raios de luz
vai girando e formando
um circulo radioso
impõe vida e calor.
-
O vento passa correndo
e cantando
o orvalho se despede
chorando
as flores abrem suas petalas
úmidas de amor
saudando em cores o Sol
a vida,
a alegria de ser e de amar.
*
MARIAZINHA GONGÍLIO
"Manhã"
Tecendo Esperanças
*
II
A noite nua
se ofereceu ao amor
Finalmente morreu.
Foi colhida
por uma flecha de luz
enviada pelo Sol.
-
Compareceu a madrugada
virgem e só
vestida de tênue claridade.
Uma estrela pálida
tentou ressuscitar a noite
esforço inútil
para sua fraca luz.
-
A madrugada convidou
anciãos e trabalhadores
para o enterro da noite
velhos foram orar por ela.
Jovens foram trabalhar
para a inauguração do novo dia
que surgiu impetuoso e víril.
-
As lampadas dos postes
se apagaram em protesto
muitos carros surgiram
para o enterro.
Tocaram buzinas como requiém.
Na rua deserta um bebado tropeça.
Alguns amantes da noite
voltaram para suas casa
deixando a boemia
e saudando com o sono o novo dia.
Alguma escuridão esquecida
num beco qualquer
foi recolhida.
A lua apagou seus faróis
fechou seu quarto minguante
e ficou nuinha
tomando banho de Sol.
O vento flutuava nas folhas
almejando inútilmente
diminuir distâncias.
O poeta agarrou um verso
para se alimentar de sonhos
na eternidade de cada dia.
*
MARIAZINHA CONGÍLIO
"Noite"
Raízes ao Vento
YOLANDA JORDÃO
Yolanda Jordão Gibson Barbosa
Nasceu a 05 de Abril de 1915, signo de áries
São Paulo, Brasil.
Poetisa, chegou a tocar piano, porém a arte pela
escrita foi mais importante.
Escreveu para vários jornais
Membro da "Academia Brasiliense de Letras", 1979. . .
Homenagens: Premio "Gazeta", 1956; Premio de
"Poesia" de Brasília, 1976;Premio "Olavo Bilac", 1977 . . .
Faleceu, 27 de novembro de 1990.
*
CANTOePALAVRAS
Fuga, 1936; Campos Cercados, 1942; Poesia, 1957;
Homens no Palco,(teatro), 1968;
Ponte de Pedra, 1970; Retrato Oblíquo, 1973;
Biografia do Edifício, 1975; Biografia do Edifício e
Anexos, 1977; Manual de Escritos, 1979; Autologia,1983 . . .
*
I
Cantares vibram ao longe
na aldeola do Vilar.
Raparigas de pés nus
lá se agacham a lavar.
-
A lavar as roupas brancas
seus saiotes e aventais
as vozes das raparigas
são notas, sons de metais.
-
Sempre a bater, a bater,
lavadeira portuguesa,
as mãos à beira do rio
no vosso amor à pureza.
-
Chilreando a borbulhar
o arroio canta e mais canta
levando as suas tristezas
pro rio grande limpar.
-
Menina tão linda e meiga
de saia de saragoça
quem te deu tanta beleza
e um par de pernas tão grossas?
-
Freguesia do Vilar
de tanta alminha enjeitada,
capuz de baeta a dar
à moça mais engraçada.
-
Para a moça mais dengosa,
para o moço mais valente
têm-se flores coloridas
ofr'ecidas pela gente.
*
YOLANDA JORDÃO
"A Moda Portuguesa"
Autologia
*
II
Hoje eu inventei: é domingo.
Descanso de anseios. Solubilidade
de cristais em águas claras.
Teto alto para vôos longos,
frente desembaçada para vistas normais.
Hoje é domingo, domingo de verdade,
recursos vários de pausa na mecânica
irrevogável dos trajetos semanais.
-
Discorrer no vazio é o caminho traçado
nestas horas tranqüilas de improvisação.
Doce, portanto, é olhar além do Cristo no céu
a altura paralela aos grandes saltos.
Mas estes assinaram feriado e se deitaram
em areias lavadas procurando desafogar tensões
mais baixas que o nível raso do mar.
E nada proíbe aos pássaros seu circuito celeste
nem os peixes a peregrinação cega e muda
entre as verdes, fluidas áreas submarinas
é domingo e o galo canta como o lápis desliza
no bloco cheio de provocações.
E o tempo - sujeição da inteligência -
que afoga resistências, que desvanece coloridos,
que solve e dissolve tramas sem ressonância.
-
Nunca eu morrer, nem Bilac, num domingo assim,
jamais num Sol assim. Antes, Drummond, não tropeçar.
Sentar-se numa pedra, à beira do caminho,
recolhendo ao regaço abandonados gatos
soltos nos vastos campos de todo o mundo
e sentir entre os dedos seus apêlos tão passivos.
Colher papoulas silvestres nas campinas de Itália,
ouvir algures sinos badalando em pardas províncias,
cantar com as raparigas - Virgens que passais ao Sol poente
pelas estradas ermas - Oh, António Nobre, Oh Portugal!
ou andar graciosamente nas ruas do Japão.
Nunca porém derramar sangue na agreste Espanha.
Antes, África, rolar contigo em sonhos róseos,
albornoz solto ao vento na soalheira candente, Bilac.
Ou bem, nos jardins americanos cortar grama plácidamente.
-
Oh detestáveis domingos do universo - apelo dos dias úteis -
no imponderável das evocações, sim, no ensejo
do meu chamado, prefiro-vos em fila,
dóceis ao meu capricho, na ordem do meu desejo.
*
YOLANDA JORDÃO
"Infância Eterna"
Autologia
YONE GIANNETTI FONSECA
Nasceu em Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais, Brasil.
Poetisa, Psicologa pela "Pontifície Universidade Católica", P.U.C..
Homenagens: Premio "Jabuti", 1976 . . .
*
CANTOePALAVRAS
A Fala e a Forma, 1963; Rosa Dialética, 1975;
Mulher, 1981. . .
*
I
Eu sou solo,
Tu és Sol.
Eu sou poros,
Tu és sonda.
Eu sou órfã,
Tu és ronda.
-
Eu me enfeito,
Tu esplendes.
Eu comovo,
Tu propendes.
Eu careço,
Tu operas.
Eu apelo,
Tu revelas.
Eu com centro,
Tu dispendes.
-
Eu sou ímã,
Tu és léguas.
Eu sou clima,
Tu és crisma.
Eu sou tátil,
Tu és timbre.
Eu pondero,
Tu projetas.
Eu arquejo,
Tu bafejas.
Eu empenho,
Tu embrenhas.
Eu merendo,
Tu te rendes.
Eu celebro,
Tu celebras.
*
YONE GIANNETTI FONSECA
"Fusão"
A Fala e a Forma
*
II
A noite desce
devassa
tunel cego
que desaba.
-
Silencio nos
quatros cantos:
quadrantes
amordaçados.
-
Sons e traços
se esquivando
o vácuo faz-se
palpável.
-
E a vidraça
fotográfica
não fotografa
a distância.
-
Sobre o ladrilho
lacônico
ergue-se, ator,
o mistério.
-
A noite, esponja
monótona,
agora apaga
a memória.
-
Nenhuma espécie
de alarme,
a noite cresce
A paz.
*
YONE GIANNETTI FONSECA
"Noite I"
A Fala e a Forma

 JÚLIA CORTINES
Nasceu em 1868, Rio Bonito, Rio de Janeiro, Brasil.
Poetisa...
Faleceu em 1948, Rio de Janeiro, Brasil
*
CANTOePALAVRAS
......................................
*
Contemplo a noite: a cúpula estrelada
do firmamento sobre mim palpita;
meu olhar, que a interroga, embalde fita
o olhar dos astros, que não vêem nada:
-
-Nessa amplitude lôbrega e infinita
que inteligência ou força inominada
numa elipse traçou a vossa estrada,
estrelas de ouro, que o mistério habita?
-
Dizei-me se, transpondo a imensidade,
alguma coisa a vós minha alma prende,
um vínculo de amor ou de verdade.
-
Dizei-me o fim da nossa vida agora:
para que serve a luz que em vós resplende,
e a oculta mágoa que em meu seio mora?...
*
Júlia Cortines
"Interrogação"
FRANCISCA JÚLIA DA SILVA
Francisca Júlia da Silva Munster
Nasceu a 31 de agosto de 1871, signo de virgem,
Vila de Xiririca, Eldorado, Vale do Ribeira, Estado
de São Paulo, Brasil . . .
Poetisa
Homenagens: Após morte sobre seu tumulo,
escultura"Musa Impassível", Francisca Júlia,
escultor Brecheret, 1933, depois transladada
a escultura para "Pinacoteca do Estado de São
Paulo", São Paulo, Brasil, 2006. . .
Faleceu a 01 de novembro de 1920.
*
CANTOePALAVRAS
Mármores, 1895; Livro da Infância, 1899;
Esfinges, 1903 . . .
*
Dorme sob o silencio o parque, com descanso,
aos haustos, aspirando, o finíssimo extrato
que a evapora a verdura e que deleita o olfato,
pelas alas sem fim das árvores avanço.
-
Ao fundo do pomar, entre as folhas, abstrato
em cismas, tristemente, um alvíssimo ganso.
Escorrega de manso, escorrega de manso.
Pelo claro cristal do límpido regato.
-
Nenhuma ave sequer sobre a macia alfombra
pousa, tudo deserto. Aos poucos escurece
a campina, a rechã sob a noturna sombra.
-
E enquanto o ganso vai, abstrato em cismas, pelas
selvas adentro entrando, a noite desce, desce . . .
E espalham-se no céu camândulas de estrelas . . .
*
FRANCISCA JÚLIA DA SILVA
"Paisagem"
FLORA FIGUEIREDO
Nasceu em 1951, cidade de São Paulo, Brasil.
Poetisa, doutorou-se como Tradutora de Inglês, na
Universidade de Michigan, E.U.A.
Homenagens: I Concurso de Poesia "Vinícius de Morais"
1983 . . .
*
CANTOePALAVRAS
Florescência, 1987; Calçada de Verão, 1989;
Amor a Céu Aberto, 1992; Chão de Vento, 2005;
Estações, 1995; O Trem que Traz a Noite, 2002 . . .
*
I
Não deixe portas entreabertas.
Encancare-as
ou bata-as de vez.
pelos vãos, brechas e fendas
passam apenas,
meias verdades
e muita insensatez.
*
FLORA FIGUEIREDO
"Lembrete"
Calçada de Verão
*
II
As tintas intensas da tela
misturam-se
um tanto indistintas
desbotam,
destoam,
derretem,
escorrem.
A " pari passu " morrem.
*
FLORA FIGUEIREDO
" Paixão"
Calçada de Verão
*
III
Peço àqueles que me amam
intensamente,
que aguardem pacientemente
do lado de fora
se a porta não abrir
e o tempo passar,
é melhor desistir e ir embora.
Fiquei com aqueles que me fazem amar.
*
FLORA FIGUEIREDO
"Aviso"
Calçada de Verão
*
IV
Amigo:
Quando estiver num momento ofendido,
faça sua queixa
ao meu ouvido,
que eu o acalento.
Se o fustiga o dissabor
de qualquer vento inquieto,
deixe que eu lhe seja o objeto
a anteparar o frio.
E se o vazio da tristeza
lhe assaltar o peito,
traga-me a dor
que arranjo um jeito
de alisar-lhe a aspereza.
Mas, por favor, venha correndo
a cada vez que se pressentir
sofrendo,
para que eu possa amparar
sua inquietação.
Estendo-lhe também a mão
quando sentir que titubeia
no caminho,
pois tenho a formula encantada
do carinho,
que o porá de novo
em pé na estrada.
Se, porventura,
tiver um momento de saudade
de uma imagem já gasta e esmaecida,
deixe que eu seja aquela amiga.
escolhida,
pra lhe ouvir a estória.
Mas se, ao contrário,
estiver vivendo um sabor de glória,
fique ao meu lado
pra que eu possa aplaudir,
embevecida,
seu momento de ascensão.
Quero ser chamada em toda situação
para ser ouvinte,
para ser usada.
E em troca dessa devoção
até desbalançada e descabida,
não quero nada,
a não ser sua aura tão dourada
a me roçar a vida.
*
FLORA FIGUEIREDO
" Amigo "
Calçada de Verão
*
V
Urge a Maritaca
desafia a paz do dia
a golpes de faca.
*
FLORA FIGUEIREDO
" sem título "
LEILA ECHAIME
Nasceu a 14 de Agosto de 1935( . . .?), signo de leão,
em São Paulo, Brasil.
Filha de emigrante libanês, e brasileira filha também de
Libaneses.  Poetisa, estudou na "Escola de Arte Dramática" de São Paulo.
Homenagens: Premio "Marly de Oliveira"; Premio "Alejandro
José Cabassa", 1981 . . .
*
CANTOePALAVRAS
Flauta Silente, 1981; Aveávida, 1983;
Poesia, Poesia, 1986; Pequenos Cantos do Fraterno, 1996;
Longe de mim, 1997; Poemas do Encantado, 1998;
Cantares da Prisioneira, 2003; Delírios, 2006;
Almas Minhas Inquietas, 2007; Elegiadas, 2007 . . .
*
I
Para te lembrar
Pinto telas de amarelo
e branco
E evoco o caminho
Das ovelhas
Num vitral de agora
Num relógio d'antes.
-
Então de amor te sou
Pastora
Solitária e constante.
-
E me reacendo
De todas as centelhas,
Pastora de flauta
tangendo as ovelhas.
-
E aquecida do leito
E das lembranças
Estendo os braços para
A frente
Como se de mim foras
O calor de um Sol
Ardente.
-
E outra vez de amor
Te sou pastora
E outra vez de amor
Te sei ausente.
*
LEILA ECHAIME
"XXI"
Cantares da Prisioneira
*
II
Por mais que eu
Viva
Por mais sofrida
Que seja a vida
Nunca hei de acreditar
Que não foi de amor
Aquele amar.
-
Cantarei cantares de amor
Para te encantar os dias
E falarei teu nome
Tantas e tantas vezes
Que minha voz
Fará eco
Na solidão
E no deserto.
-
Teu nome - minha sina -
De constância
E de distância.
-
De mulher
E de menina.
*
LEILA ECHAIME
"XXV"
Cantares da Prisioneira
*
III
Ah! Se pudesse voltar
Aos tempos idos,
Se pudesse de novo
Mergulhar as idas águas
E te saber de palavras
E te sentir nos caminhos
Das chegadas
E das partidas.
-
Ah, minha alma alagada
De águas e da tua vida!
-
Quem, quem antes teria
Me visto
Deste momento aflito,
Desta insana recordação,
-
Desta angústia, deste silêncio
Deste te saber perto
Todo o tempo
E me saber tão indivisa,
Mulher vinda,
Mulher ida
De loucura e de imensidão.
-
Que antes teria me
Ouvido
As preces e os gemidos.
Esses delírios tão vivos
E tão meus.
-
Quem antes teria me visto
Mulher ida de loucura,
A falar a sós com Deus !
*
LEILA ECHAIME
"XLV"
Cantares da Prisioneira

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